Crédito de PIS/Cofins e publicidade nos serviços

Crédito de PIS/Cofins e publicidade nos serviços

Por Jimir Doniak Jr. e Alessandra M. I. Katori

O direito ao crédito de PIS/Cofins proveniente da aquisição de insumos pelas pessoas jurídicas submetidas ao regime não cumulativo suscita discussões desde seu início. Nesta breve análise, refletiremos acerca da possibilidade de as empresas prestadoras de serviços tomarem créditos por gastos com publicidade e propaganda, com o objetivo de conquistar clientes. A reflexão sobre esse ponto se faz necessária, visto ser decisiva a diferença entre as atividades econômicas de produção de bens e as de prestação de serviços, que não vem sendo apontada com clareza.

Como se sabe, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) concluiu que o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância do bem ou serviço para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada.

Pode ser insumo da prestação de serviços aquilo que se gasta antes dela, como a publicidade para conquistar o cliente
A Receita Federal interpreta restritivamente essa decisão quando o contribuinte se dedica à produção ou fabricação de bens e à posterior venda: insumo seria somente o bem ou serviço utilizado na produção/fabricação de bens ou produtos. Para ela, o que não for gasto com a produção não se qualificaria como insumo, de tal modo que nem sequer se colocaria a questão da essencialidade ou relevância. Veja-se que a Receita Federal tem uma percepção bastante física da atividade econômica e com olhar limitado ao processo produtivo. Com isso, ela ignora que a venda posterior do bem igualmente faz parte da atividade econômica e os serviços que viabilizam a venda são igualmente insumos.

A despeito disso, aceitemos esse entendimento, apenas para aplicá-lo à atividade econômica de prestação de serviços e verificar se ele conduz à mesma vedação.

A atividade econômica de prestação de serviços diferencia-se da atividade de produção/fabricação de bens ou produtos. Ainda que desconectada com a realidade, pode-se aventar a possibilidade de uma empresa produzir bens sem ter a perspectiva de clientes para comprá-los. Nessa visão estreita, a publicidade não seria essencial ou relevante para produzir bens, mas somente para vendê-los, após a produção.

Algo bem distinto se passa com a atividade econômica de prestação de serviços. Para esta, a conquista do cliente é essencial para viabilizar a própria prestação de serviços. Isso pela simples razão de que não se presta serviços para o nada. Presta-se serviços para o cliente. Prestação de serviços e cliente são duas realidades fisicamente indissociáveis, não se concretizando aquela se este não estiver presente.

Para certificar-se dessa conclusão, basta imaginar uma empresa prestadora de serviços na vã e inusitada tentativa de prestar serviços sem ter um cliente. É algo simplesmente inimaginável. A prestação de serviço não se viabiliza. Por exemplo, sem o cliente um hotel não presta serviços de hospedagem e um hospital não presta serviços médicos sem ter um paciente que o contratou. Em outras palavras, se o cliente não tiver sido conquistado, a prestação de serviços não ocorre.

Verifica-se aí a diferença, essencial, para saber se há insumo e direito de crédito de acordo com a própria visão restritiva da Receita Federal: sem cliente ainda assim consegue-se produzir bem, mas sem cliente não se presta serviços. Logo, se pode ser insumo aquilo que se gasta antes da produção, do mesmo modo pode ser insumo da prestação de serviços aquilo que se gasta antes dela, como a publicidade para conquistar o cliente e com isso viabilizar a própria atividade econômica do serviço.

De qualquer forma, para a qualificação como insumo e caracterização do direito de crédito são ainda requeridos os requisitos do STJ, de essencialidade ou relevância do gasto. Convém ressaltar, porém, que o tribunal afirmou que os requisitos de essencialidade ou relevância estão presentes quando a falta do gasto em análise inviabiliza não só a própria prestação ou sua qualidade, mas também a quantidade. Por isso, se for viável comprovar que a falta da publicidade priva a empresa da quantidade de serviços prestados, o critério da essencialidade ou relevância acolhido pelo STJ é atendido.

Ora, é inegável que o gasto com publicidade e propaganda pode ser essencial para conquistar clientes em diversos tipos de prestação de serviços, como em atividades vinculadas ao lazer (cinemas e shows), transporte, viagens, hotéis. Outro exemplo é o analisado na Solução de Consulta Cosit nº 32/2021, na qual uma empresa prestadora de serviços de limpeza não possuía estabelecimento físico e captava seus clientes pela internet, dependendo de eficiente propaganda na rede que direcionava seus clientes potenciais à sua página na internet.

A despeito disso, equivocadamente, a Cosit concluiu que esses gastos não configurariam insumo, igualando a atividade econômica de prestação de serviços à de produção de bens, em manifesto equívoco. Ademais, a Cosit também sustentou que tais dispêndios não seriam imprescindíveis para que clientes em potencial tomassem conhecimento de seus serviços. Ocorre que o STJ não exige a imprescindibilidade. Basta a relevância, inclusive para viabilizar a quantidade de operações.

Em suma, a Receita Federal equivoca-se na aplicação dos critérios por ela própria estabelecidos: na atividade de produção de bens a razão para negar a natureza de insumo aos gastos com publicidade é que eles não dizem respeito à produção, mas na atividade de prestação de serviços a realidade é outra. Os gastos com publicidade dizem respeito, sim, ao próprio serviço, pois com eles se conquista o cliente, sem o qual não há a atividade econômica. A conclusão, então, é que os gastos com publicidade podem dar direito de crédito de PIS/Cofins na prestação de serviços.

Jimir Doniak Jr. e Alessandra M. I. Katori são, respectivamente, sócio e advogada da Advocacia Lunardelli

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

Fonte: Valor Econômico / Associação Paulista de Estudos Tributários, 16/8/2021   

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