- por Nilson Sousa
Por Joice Bacelo e Beatriz Olivon — Do Rio e Brasília
O Supremo Tribunal Federal (STF) definiu ontem como deve ser aplicada a decisão que estabeleceu a incidência do ISS sobre as operações com software. Os ministros, por meio da chamada modulação de efeitos, fecharam praticamente todas as portas para evitar cobrança retroativa por parte de Estados e municípios ou mesmo para o contribuinte recuperar o que pagou indevidamente.
Foram fixadas soluções para oito situações diferentes. Só haverá uma possibilidade de cobrança retroativa. O município poderia executar a empresa que não recolheu nada, nem ISS nem ICMS. O contribuinte que pagou os dois tributos, por outro lado, poderá pedir de volta aos Estados os valores recolhidos, no passado, de forma indevida.
Para as empresas que têm ações judiciais em andamento contra os Estados, para não pagar o ICMS, os juízes deverão aplicar o novo entendimento, segundo os ministros. Ações movidas pelos governos estaduais para cobrança do imposto estadual, acrescentaram, deverão ser extintas.
Nas ações de cobrança movidas pelos municípios também deverá ser aplicado o novo entendimento do STF, ou seja, confirmando a dívida de ISS. Haverá exceção somente para casos de contribuintes que, no passado, tenham pago o ICMS. Nesse caso, o município não terá direito ao imposto.
A chamada modulação de efeitos havia ficado pendente na última quinta-feira, quando eles concluíram que deve incidir ISS e não ICMS sobre softwares. O entendimento — que muda jurisprudência de mais de duas décadas – vale tanto para o produto “de prateleira”, comercializado no varejo, quanto para o fornecido por encomenda.
A interpretação, até esse julgamento, era a de que sobre o software de prateleira deveria incidir o ICMS. Sobre o feito sob encomenda, ISS. Esse novo entendimento atende o pleito das empresas de tecnologia.
Para elas pode ser bem mais vantajoso pagar ISS do que ICMS. Na capital paulista, por exemplo, são cobrados 2% de ISS, enquanto que o ICMS tem alíquota de 5% no Estado. Conta ainda o fato e a apuração do imposto estadual ser mais complexa do que a tributação municipal.
A tributação sobre softwares foi julgada por meio de duas ações diretas de inconstitucionalidade. Uma delas, a ADI 1945, foi proposta em 1999, quando a transferência eletrônica do software ainda era feita por disquete. Hoje, a comercialização ocorre por meio de download ou streaming. A ADI 5659 é mais recente e abrange os meios atuais para a comercialização de software.
No entendimento do advogado Enzo Megozzi, do Abreu, Goulart, Santos, Freitas & Megozzi Advogados, a proposta de modulação ficou bastante coerente, tratando daqueles que recolheram só ISS, ICMS, ambos os tributos e aqueles que tinham ações judiciais em curso. “Aparentemente pacifica a questão, protegendo inclusive os contribuintes de novas cobranças quanto aos recolhimentos realizados nos períodos anteriores ao julgamento”, diz ele, que assessora a Brasscom, a Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação, parte interessada no julgamento.
O advogado Saul Tourinho Leal, que participou do caso representando a Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes), considera a modulação “emblemática”. “Numa sofisticação jamais empregada, adiantou-se a oito hipóteses que gerariam judicializações futuras desnecessárias”, afirma. “Esse desfecho deve se tornar um dos mais importantes precedentes tributários da história do Supremo.”
Jorge Sukarie, presidente da brasileira Brasoftware, principal distribuidora de sistemas Microsoft, e vice-presidente da Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes), nota que o STF teve uma preocupação de não penalizar os Estados com a modulação, mas que a arrecadação do ICMS já não era tão substancial como a do ISS entre as empresas do setor.
Ele cita dados da Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais (Abrasf) mostrando que, entre 2015 e 2019, o recolhimento de ISS sobre software nos oito maiores municípios brasileiros foi de R$ 2,1 bilhões. Já o ICMS recolhido aos três maiores Estados foi de R$ 268 milhões. Para ele, uma eventual decisão por manter a cobrança do ICMS seria “uma catástrofe” para o setor. (Colaboraram Adriana Aguiar e Daniela Braun, de São Paulo)
Fonte: Valor Econômico
Associação Paulista de Estudos Tributários, 25/2/2021