- por Nilson Sousa
Por Adriana Aguiar — De São Paulo O Superior Tribunal de Justiça (STJ) poderá definir, por meio de recurso repetitivo, a discussão sobre a possibilidade de incidência da contribuição previdenciária patronal, Riscos Ambientais do Trabalho (RAT) e contribuições devidas a terceiros (como as do Sistema “S”) apenas sobre o valor líquido da folha de pagamentos das empresas – sem os valores retidos ou descontados dos empregados. Três processos representativos da controvérsia foram indicados à Corte pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), com sede em Porto Alegre. Até agora, há apenas decisões da 1ª e da 2ª Turmas sobre o assunto, contrárias ao contribuinte (REsp 1956256 e REsp 1949888).
A discussão é importante porque as empresas pagam sobre a folha 20% de contribuição patronal, além de 1% a 3% de RAT e de 4,5% a 5,8% de contribuições devidas a terceiros, a depender do setor. Hoje, existem aproximadamente cinco mil ações sobre a tese no país, de acordo com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Nos processos, os contribuintes alegam que a intenção do legislador, com a edição da Lei do Plano de Custeio da Seguridade Social (nº 8.212, de 1991), foi a de que a contribuição previdenciária patronal incidisse sobre o valor líquido da folha de salários.
O impacto financeiro é significativo. Isso porque se pede que sejam excluídos da base de cálculo dessas contribuições patronais: os valores retidos ou descontados de vale-transporte, vale-refeição ou alimentação, plano de saúde, odontológico e farmácia, além de Imposto de Renda Retido na Fonte e contribuição previdenciária dos empregados. No TRF da 4ª Região, o posicionamento também é desfavorável ao contribuinte.
Ao receber o pedido de uma empresa do setor de couro para levar a discussão ao STJ, o vice-presidente da Corte, Fernando Quadros da Silva, decidiu afetar esse caso (processo nº 5023186-96.2021.4.04.7108/RS) e mais outros dois como representativos da controvérsia – que estão em segredo judicial (nº 5011877-14.2021.4.04.7000 e 5052681-58.2020.4.04.7000). Segundo o advogado que assessora a empresa do setor de couro no processo, Felipe Cornely, do Diehl & Cella Advogados, agora deve ser designado um relator para analisar se a questão será julgada por meio de recurso repetitivo. Para ele, seria uma “oportunidade para consolidar uma posição vinculante para todos os processos em tramitação no Brasil”. Por enquanto, afirma o advogado, existem apenas decisões esparsas no STJ. “Se for afetado como repetitivo, o STJ poderá ter um aprofundamento maior na discussão, reunir todos os envolvidos no debate e tentar pacificar o tema.” O advogado Gustavo Mitne, sócio do Balera, Berbel e Mitne Advogados, afirma que há uma confusão muito grande sobre o assunto e que não se trata de discutir salário líquido. Ele alega que deve entrar no cálculo das contribuições previdenciárias apenas o que for destinado a retribuir o trabalho, como prevê o artigo 195, inciso I, alínea a, da Constituição e o artigo 22, inciso I, da Lei nº 8.212, de 1991. Não seria o caso, segundo o advogado, dos valores descontados dos funcionários referentes a vale-transporte, alimentação e plano de saúde.
Em relação a planos de saúde e odontológico, acrescenta, ainda existe a argumentação de que a Lei nº 8.212, de 1991, estabelece que não incide contribuição previdenciária sobre esses valores (artigo 28, parágrafo 9º, alínea q). “Temos leis expressas dizendo que não incide contribuição previdenciária patronal para vale-transporte, vale-alimentação e coparticipação de planos de saúde”, diz o advogado. “Se não incide para a empresa, não poderia incidir nos valores pagos pelo empregado também, que é o hipossuficiente.” A estratégia do escritório tem sido discutir cada desconto em um processo para aprofundar o debate. A banca tem diversos processos a respeito, inclusive decisões favoráveis que transitaram em julgado (não cabe mais recurso) nos TRFs.
Na visão da Receita Federal, porém, esses valores fizeram parte da remuneração do trabalhador e não podem ser excluídos da base das contribuições, que é a folha de pagamentos. O entendimento está na Solução de Consulta nº 96, editada em junho de 2021 pela Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), que orienta os fiscais do país. Esse mesmo posicionamento também já tinha sido alvo de outras soluções de consulta – as de nº 4, 35 e 313, todas de 2019, e a de nº 58, de 2020. Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional não deu retorno até o fechamento da edição.
Fonte: Valor Econômico / APET