- por Nilson Sousa
Fisco muda posição e baliza entendimento com julgado do STF sobre tributação de softwares.
A Receita Federal concluiu que valores remetidos ao exterior em razão de operações de licenciamento de softwares configuram contrapartida à prestação de serviços e estão sujeitos à incidência de PIS/Cofins-Importação. O entendimento foi exposto na Solução de Consulta Cosit 107/2023, publicada na última terça-feira (13/6) no Diário Oficial da União.
A posição representa uma mudança de orientação do fisco. O órgão considerava que as contribuições não poderiam incidir sobre a remessa de valores ao exterior decorrentes do licenciamento de softwares não personalizados, porque, nesses casos, ocorria apenas a licença ou uso de marca. Não haveria uma contraprestação por serviço prestado.
O novo posicionamento reflete a decisão proferida em 2021 pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na ADI 5.659, na qual os ministros acabaram com a distinção que havia até então entre os programas customizados e os de prateleira (vendidos em larga escala). No julgamento, a Corte definiu a sujeição do licenciamento à tributação pelo ISS.
De acordo com Daniel Clarke, advogado tributarista do Mannrich e Vasconcelos, desde o julgamento “havia uma expectativa por parte dos contribuintes para saber se os fundamentos daquela decisão seriam espraiados para a cobrança dos tributos federais em operações envolvendo a licença de softwares. Esse receio vem sendo, aos poucos, confirmado”.
O pontapé foi a SC Cosit 36/2023, considerando atividades de licenciamento ou cessão de direito de uso de programas padronizados ou customizados em pequena extensão como aquisição de serviço. Depois veio a SC Cosit 75/2023, segundo a qual licenças de uso de software caracterizam royalties e estão sujeitas à incidência de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF).
Agora, com a nova solução de consulta, afirma Clarke, a Receita “não apenas confirmou seu novo entendimento pela incidência de IRRF nas operações de licença de uso de software, independentemente de customização ou do meio empregado na entrega, como reformou sua posição passada quanto à incidência do PIS/Cofins-Importação”.
A solução de consulta ainda esclareceu não haver incidência de Cide sobre a remessa de valores ao exterior pela licença de software, exceto se envolver transferência de tecnologia. O tributo será devido em caso de contratação de serviço técnico de manutenção pela atualização da versão do próprio software, desde que não origine novo licenciamento.
Uma solução de consulta oferecida pela Receita Federal tem efeito vinculante para a administração pública a partir de sua publicação. Isso significa que auditores fiscais têm de observar o teor da SC diante de situações semelhantes. Ela também orienta a conduta dos contribuintes, que podem ser autuados caso descumprirem aquilo que foi objeto de resposta.
Diego Diniz advogado do escritório Daniel & Diniz Advocacia Tributária, avalia que, embora uma solução de consulta tenha o objetivo de evitar a judicialização, na medida em que externa oficialmente a posição da Receita sobre um determinado assunto e estabelece um “padrão de conformidade para os contribuintes”, o último posicionamento pode gerar o efeito contrário.
“É possível que alguns contribuintes não concordem com o teor da consulta, no particular caso da SC 107/2023, em razão de uma possível incongruência entre as naturezas jurídicas atribuídas para o licenciamento de software, ora de royalties para fins de IR-Fonte, ora de serviço para fins de PIS e Cofins incidentes na importação,” afirma.
O especialista refere-se à última parte da Solução de Consulta Cosit 107/2023. A Receita estabeleceu, na conclusão, que o pagamento por licença de uso de software caracteriza remuneração de direitos autorais e está sujeito à incidência de IRRF. Na mesma seção, quando abordou a incidência de PIS/Cofins-Importação, o órgão definiu que os valores pagos pela adesão a contratos de licenciamento seriam uma contrapartida por prestação de serviços.
Flávio Yoshida, do Rayes e Fagundes, identifica a mesma discrepância. Segundo ele, “seria mais fácil se a Receita tivesse adotado prestação de serviços para tudo”. Mesmo assim, o especialista considerou que não haveria um impacto significativo para o Imposto de Renda.
O advogado acredita haver outro espaço para judicialização. Para ele, como o Supremo não tratou de PIS/Cofins-Importação no julgamento da ADI 5.659, mas sim de ICMS e ISS, “não há uma vinculação direta da decisão. Ou seja, o tema ainda pode ser apreciado pelo Judiciário”.
Fonte: jota.info