- por Nilson Sousa
Por Joice Bacelo e Beatriz Olivon
Roque Antonio Carrazza estava no Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) quando os ministros, em 2014, por maioria de votos, decidiram excluir o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. Após anos de tramitação, outro recurso foi julgado em 2017, desta vez com status de repercussão geral, sob os olhos atentos do advogado, que é professor titular de direito tributário da PUC-SP e autor de ao menos 14 livros nessa especialidade.
Para Carrazza, dizer agora que a restituição do que foi pago no passado produzirá um “rombo” não previsto no orçamento da União, além de ser falso, não justifica a modulação dos efeitos da decisão. Ele ainda nega, em entrevista ao Valor, que o governo foi pego de surpresa.
Valor: O que significa o desfecho desse caso para o contribuinte?
Roque Antonio Carrazza: Se, como se espera, for totalmente favorável ao contribuinte, representará, sem dúvida, a confirmação dos seus direitos constitucionais subjetivos, máxime o de recolher o PIS e a Cofins nos montantes devidos e de reaver ou compensar o que pagou “a maior”. Concordo que os interesses fazendários são importantes, mas só podem prevalecer quando em sintonia com os superiores interesses públicos, como o de só ser obrigado a suportar tributos lançados e cobrados de acordo com os ditames constitucionais e legais.
Valor: Por que o contribuinte é contra a modulação de efeitos?
Carrazza: Simplesmente porque ela descabe no caso em julgamento. Houve a declaração da inconstitucionalidade da inserção do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins. O decidido no RE 574706 não alterou a jurisprudência dominante, mas, pelo contrário, confirmou a posição do STF firmada nos autos do RE 240785. E a modulação, negando a possibilidade de repetição do indébito, convalidará o enriquecimento ilícito da União, em afronta aberta ao direito de propriedade, que, entre outras consequências, proíbe que tenham os tributos efeitos confiscatórios. Depois, é muito fraco, para dizer pouco, o argumento fazendário, de que a União foi tomada de surpresa com a decisão em tela. Rememore-se que o assunto vem sendo julgado desde 1992.
Valor: Qual é o quórum necessário para a modulação de efeitos?
Carrazza: A meu sentir, oito votos, ou seja, os votos de dois terços dos ministros, como determina o artigo 27 da Lei nº 9.868, de 1999.
Valor: Qual ICMS deve ser retirado do cálculo do PIS e Cofins?
Carrazza: Sem dúvida, todo o ICMS destacado na nota fiscal, como consta do voto da eminente relatora, a ministra Cármen Lúcia, que foi acompanhado pela maioria. Sua Excelência deixou claro que todo o ICMS não se inclui na definição de faturamento, pelo que não pode integrar a base de cálculo do PIS e da Cofins.
Valor: Como a mudança de composição do STF, em relação a março de 2017, pode afetar o julgamento dos embargos de declaração?
Carrazza: Entendo que isso não vai acontecer. Em relação à modulação, minha expectativa é a mais otimista possível. De fato, os ministros e ministras do Supremo, mesmo os que nele ingressaram depois de março de 2017 (os ministros Alexandre de Moraes e Nunes Marques), são juristas consagrados e experientes, que votam de acordo com sua ciência. Certamente não se deixarão influenciar por eventuais pressões, venham de onde vierem.
Valor: A conclusão desse caso vai afetar as chamadas teses filhotes?
Carrazza: Não necessariamente, muito embora o precedente abra espaço a novas discussões jurídicas. Assim, por exemplo, as questões da eventual exclusão do ISS da base do PIS e da Cofins, bem como, dessas próprias contribuições das suas bases de cálculo, demandarão novos e renovados estudos da parte dos ministros do Supremo.
Fonte: Valor Econômico
Associação Paulista de Estudos Tributários, 26/4/2021